Deus não faz
absolutamente nada à toa. Tudo o que Ele faz tem um propósito e uma razão de
ser. Com isso em mente, vem a pergunta: por que Deus decidiu escolher logo um
cordeiro para prefigurar e simbolizar Cristo?
Por que
Jesus é o Agnus Dei, o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo? Por
que não o texugo de Deus, o avestruz de Deus, a jaguatirica de Deus ou o camelo
de Deus? Afinal, quando o Senhor transmitiu ao povo de Israel a Lei e instituiu
o sacrifício levítico como um tipo daquele que haveria de vir tinha à
disposição uma vasta fauna.
Uma opção
seria até mesmo o leão, visto que o Messias é o Leão de Judá. Faria sentido.
Imagine: cada pecador teria de sacrificar um leão, demonstrando seus méritos de
caçador para aprisionar a fera e levá-la até o templo. Seria um preço e tanto
para expiar os pecados. Mas não, o animal escolhido como símbolo maior de Jesus
foi… o insosso cordeiro. Por quê?
Depois de
alguma reflexão e de analisar diferentes passagens da Bíblia, conclui-se que a
escolha provavelmente foi feita pelo caráter manso, pacífico e obediente desse
animalzinho. Isaias 53.7 infere isso: “Ele foi oprimido e humilhado, mas não
abriu a boca; como cordeiro foi levado ao matadouro; e, como ovelha muda perante
os seus tosquiadores, ele não abriu a boca”. Ou seja: o cordeiro é um animal
calmo, que não revida, não ofende, não ataca, não agride. Em resumo: é um
animal que não exprime raiva.
Ah, que
percepção magnífica! A própria essência do Salvador é antirraivosa. É plácida.
É uma essência de amor, alegria, paz, paciência, benignidade, bondade,
fidelidade, domínio próprio e… mansidão – que é o fruto do Espírito. E todos
nós sabemos que devemos ser imitadores do Mestre.
Que devemos
ter o caráter de Cristo. Se por um lado essa percepção é fantástica, pois nos
leva a perceber o que Deus quer que sejamos, por outro lado é assustadora, pois
nos faz ver o quanto a noiva do Cordeiro está distante do que Deus quer que
sejamos. Isso porque temos vivido uma crise crônica de… raiva.
Sim, a
Igreja de Jesus Cristo está com raiva. Muita raiva. Eu e você nos tornamos
pessoas raivosas e valorizamos a raiva como uma suposta virtude cristã.
“Imagina, Mauricio”, você poderia dizer, “eu não sinto raiva, a Igreja não
sente raiva, que exagero”. Mas fato é que o cheiro de raiva paira no ar do
templo.
Pense em
quem são os líderes cristãos mais visíveis no Brasil atualmente. De um lado
temos pastores na TV que gritam, esperneiam, cospem, agridem, ofendem, batem na
mesa e transpiram toda sua testosterona. De outro lado temos aqueles que
criticam esses mesmos pastores e se referem a ministros de Deus como “bundões”.
Há ainda
aqueles que para defender a liberdade religiosa vão a programas de auditório e
organizam manifestações com agressões verbais e bate-bocas com pessoas
não-cristãs que defendem o pecado. Vemos ainda conclamações enfurecidas do povo
de Deus a lutar contra legislações que desaprovam (como se esse fosse o papel
da Igreja).
Vemos também
guerras internas em denominações pela disputa de poder e cargos, em que
sacerdotes são vistos em vídeos no youtube em discussões enraivecidas com
outros sacerdotes, com ofensas rábicas pelo twitter. E por aí vai.
Por falar em
youtube e twitter, basta gastar algum tempo nas redes sociais que você verá
pastores que falam o tempo todo de amor, mas usando um discurso extremamente
raivoso para defender o seu ponto de vista sobre Deus e a Igreja. Nunca vi
tanta raiva sendo destilada em nome do amor.
“Amemos uns
aos outros, seus imbecis”, é só o que falta algum desses líderes postar no
twitter. “Nós somos os da graça e os outros os da religião”, alfinetam outros.
E assim segue a Igreja nas redes sociais, com litros e mais litros de raiva
inundando nossos computadores.
E lógico que
com líderes assim a membresia acaba se contaminando. Achando que é isso aí. Que
esse é o caminho. Que botar pra quebrar e sair arrebentando é o papel do
cristão. É só passar mais um tempinho surfando pelas redes sociais e alguns
blogs de maior expressão no meio evangélico para ver que cada um defende aquilo
em que crê não pela exposição de argumentos calmos, racionais e lógicos em
favor daquilo em que acreditam, mas sim com ataques raivosos a pessoas,
teologias e idéias de que discordam. A Igreja não está usando das ferramentas
bíblicas para defender suas posturas e crenças, mas sim armas do mundo: a
ofensa, a agressão, a ironia, o sarcasmo, os ataques. Raiva!
Com isso,
nós desvirtuamos completamente a missão. Nos desviamos do que Cristo espera de
nós. Não fazemos uso do exemplo de Jesus, pelo contrário: parecemos mais
integrantes da juventude hitlerista ou da Ku Klux Klan em nosso comportamento
público do que da Igreja do Cordeiro que se entregou em silêncio, que deu a
outra face, andou a segunda milha. E com isso nos tornamos mundanos e pagãos.
Recentemente
publiquei aqui no APENAS um Post raivoso. Deixei-me contaminar pelo espírito
que tem predominado nas discussões teológicas e nas redes sociais entre os
cristãos. Mea culpa. Mas no dia seguinte reli o que tinha escrito e vi o quão
distante da proposta de Deus para nós estava meu texto. Ao desabafar, me deixei
contaminar por essa nuvem da raiva que paira sobre programas de TV evangélicos,
blogs e redes sociais… e pequei. Cometi o pecado da raiva. Senti-me torpe.
Diante
disso, pedi perdão ao Cordeiro e deletei o Post. Peço perdão também a você que
me lê por ter somado minha raiva momentânea a esse tsunami de rancor e ira que
tem varrido os rincões evangélicos. Pois não quero ser como esses cristãos
raivosos. Não quero usar as armas do mundo. Quero ser manso e humilde de
coração, servindo de exemplo para o mundo e não sendo visto como igual a ele.
Não sou perfeito, mas quero caminhar para cada vez mais ser uma ovelha do
Cordeiro e não um gladiador da fé.
Por isso
decidi me afastar um pouco do twitter. Senti a necessidade de voltar à
retaguarda, me recompor, lembrar do ponto onde caí e retomar a estrada da paz.
Sair do burburinho, da multidão de vozes, para respirar fundo, ouvir o vento, o
pulsar do coração e o cicio calmo do Senhor. O murmurejo do Cordeiro. Tenho
falado menos e me contentado a levantar minha voz aqui no mosteiro do APENAS. E tem sido bom, pelo menos por enquanto.
A Igreja tem
que repensar seu tom de voz. Tem de escolher melhor as palavras. Precisamos
usar mais a gentileza. Desistir da ironia e do sarcasmo. Aí sim eu e você
estaremos começando a ser menos parecidos com apresentadores de programas
vulgares de auditório e mais parecidos com Cristo. Não me interessam tele
pastores agressivos. Não me interessam líderes que falam de graça, mas chamam
outros cristãos de “bundões”. Não me interessam líderes que acusam a igreja
institucional de não ter amor e para isso exalam raiva para todos os lados do
twitter. Não me interessa o bate-boca amargo e arrogante de cristãos nas redes
sociais. Não me interessam leões. Me interessa o Cordeiro. Quero aprender com
Ele e, cada dia mais, me tornar um bem-aventurado pacificador. Suave com o
próximo. Carinhoso sem deixar de ser firme. Falar a verdade em amor. E
argumentar com o próximo como gostaria que argumentassem comigo. Mesmo que isso
me custe as duas faces doloridas e os pés feridos por andar uma milha a mais.
Essa é minha meta.
Jesus saiu
da Cruz cuspido, nu, ofendido, machucado, transpassado e humilhado por uma
multidão de pessoas raivosas. Mas saiu plenamente vitorioso. Com raiva? Creio
que não. Pois, senão, teria saído plenamente derrotado. E você, como tem se
comportado? Como o Cordeiro diante de seus algozes ou como os algozes diante do
Cordeiro?
Paz a todos
vocês que estão em Cristo. (*)
Louvai ao Senhor!
Por Cristo. Em
Cristo. Para Cristo.
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